A intenção da criação deste blog se fez perante a necessidade de uma discussão séria sobre um dos gêneros mais polêmicos de todos os tempos dentro do metal, o black metal.
Este estilo tem particularidades ideológicas, filosóficas e musicais, que o distinguem de outras vertentes do metal.
Além disso, será debatido os vários subgêneros dentro do Black Metal para buscar compreender o porque destes diferentes rótulos, tais como pagan, atmosferic, NSBM, entre outros.
Por fim, serão postados entrevistas, álbuns e vídeos de bandas relacionadas ao estilo, assim como texto de grandes pensadores que influenciaram o Black Metal como um todo.

segunda-feira, 25 de abril de 2016

Miasthenia - Legados do Inframundo











Lançado em meados de 2014, Legados do Inframundo  veio com a árdua missão de suceder  Supremacia Ancestral, o qual eu considero o ápice da banda em todos os sentidos. Nele se aliou a técnica e melodia com bastante agressividade e uma temática muito mais detalhada e aprofundada que os trabalhos anteriores. Quando uma banda chega nesse nível ela passa a ser pressionada por sua própria sombra. Pois se cria uma expectativa muito grande em torno dos próximos trabalhos e a crítica sobe de nível, em algumas bandas isso acaba se tornando negativo afetando no resultado de seus futuros lançamentos, algumas perdem sua essência com tamanho profissionalismo e outras acabam por perder completamente o foco do trabalho iniciado, seja lá por qual motivo, pois cada um tem o direito de fazer o que quiser com sua música como, por exemplo, explorar outros caminhos que nada tem haver com a raiz de sua arte, claro que quem é fã também terá todo direito de continuar seguindo determinada banda ou não.

Mas aqui estamos tratando de um caso muito bem sucedido. Vi muita gente considerando esse o melhor álbum da banda e não discordo, porém ainda o coloco praticamente no mesmo nível do anterior... Não por demérito, mas sim pela qualidade que vejo em Supremacia Ancestral. Mas é claro que houveram evoluções, ele está ainda mais bruto e a guitarra de Thormianak (que também faz o contra –baixo no estúdio) esbanja técnica de várias formas, o teclado de Hecate muito bem encaixado fazendo também a parte grave do baixo nos shows, a bateria é muito dinâmica e encontramos do arrastado até metranca, ela fica por conta de V. Digger.






Serpente Emplumada e Pirâmide de Chichen Itzá









O que quero dizer que essa questão de qual trabalho é o melhor é muito mais relativa do que parece pois os trabalhos anteriores como XVI e Batalha Ritual apesar de mais simples, cada um tem a sua marca e característica  que podem muito bem serem melhores que os trabalhos recentes pra muita gente. Também não seria absurdo alguém dizer que as músicas da demo Faun – Trágica Música Noturna são suas preferidas, pois são todos grandíssimos trabalhos e a música tem essa magia de fazer um trabalho totalmente simples te levar ao êxtase e igualar a potência de um mais complexo. No metal então não existe essa competitividade de campeões, top sei lá das quantas (ao menos na minha opinião), todo grande trabalho independente de sua complexidade técnica tem seu espaço entre os grandes. Que diga Hellhammer,  Venom, Sodom e Bathory e companhia em seus primórdios.

Para entender todas essa caminhada vamos resumir a discografia da banda. Miasthenia iniciou seus trabalhos em 94, bem no auge do Black Metal e já em 95, lança sua primeira demo tape de forma independente, ela saiu em duas versões, sozinha e em split com o Lament contento mais 2 covers do Samael e 1 do Grand Belial’s Key. Com uma sonoridade bem simples e sem teclado, em um andamento bem cadenciado. Nessa época Hecate ficava por conta da guitarra e quem assumia os vocais era Vlad D’ Hades (Vulturine). O trabalho chama-se Para o Encanto do Sabbat



Para o Encanto do Sabbat em split
Miasthenia / Lament


Demo Tape Para o Encanto do Sabbat








Em 96 a banda lança Faun- Trágica Música Noturna,  em demo-tape pela Bloodstar elevando o patamar da banda no cenário. Em 98 a Evil Horde Records lança essa demo junto a outro clássico do metal brasileiro, a demo My Visions in the Forest do grande Song D’ Enfer. Lançado em um split Cd com o nome Visions of Nocturnal Tragedies. Nesse trabalho a banda já introduz o teclado a sua sonoridade e Hecate começa a fazer algumas passagens de vocais. A influência da escola grega é muito grande e a banda forma uma identidade maior.





Faun - Trágica Música Noturna em
Split Miasthenia / Song d' Enfer
Faun - Trágica Música Noturna


























Mas os anos 2000 foi onde a banda realmente concretiza uma forma totalmente original ganhando mais força, velocidade e técnica a cada álbum e assumindo por completo a temática pré-colombiana que foi inovadora pra época. Com os clássicos XVI (2000), Batalha Ritual (2004) e Supremacia Ancestral (2008). Em 2011 lançando o dvd Ritual da Rebelião com vídeos ao vivo por todo país.





XVI
Batalha Ritual















Supremacia Ancestral
DVD Ritual da Rebelião





















         Vou aproveitar o que o Miasthenia representa e entrar em um assunto mais polêmico. A superioridade de uma raça...

         Não acho um ancião viking mais importante que um ancião nativo de cultura africana, pré-colombiana ou qualquer outro povo pagão. Pra mim estão no mesmo nível de contato com a natureza, o que é o mais importante no paganismo. Acho muito interessante a pessoa seguir a raiz da própria cultura de seus descendentes, mas isso não é regra e nem prova de que a pessoa é superior. Todas as culturas ditas pagãs levam para o mesmo caminho, o que interfere é o modo de como a utiliza. O Miasthenia é uma prova de sucesso de pessoas que não são 100%  puras de sangue do culto que praticam (longe disso) e mesmo assim conseguem atingir em cheio sua filosofia ou espiritualidade. Apesar de que praticam a cultura raiz do continente onde habitam, o qual considero muito importante.

         Pra mim o segredo é descobrir qual caminho  que você mais identifica para atingir determinado objetivo que é comum entre todas as culturas pagãs.  O pensamento de superioridade do próprio povo é um pensamento primitivo e batido hoje em dia pela realidade da vida. Pois todos conhecemos através da bíblia a mania de superioridade dos judeus, afinal o divino só favorece a eles e o resto é erro ou blasfêmia. E também lembramos o fato de como se não houvesse cristãos 100% sangue ariano. Afinal todos os povos lutaram contra essa praga e foram vencidos “territorialmente”, e muito por culpa de uma parte do próprio povo que foi aceitando passivamente em todos os continentes do planeta. Então raça e cultura nesse sentido tem significados complexos e as vezes distintos.

         Reconheço a luta contra a perda de identidade com a globalização mas creio que essa postura de superioridade de um povo seja falha contra o principal problema.

         Quero dizer com tudo isso que pra mim as pessoas que praticam esse pensamento atrasado estão a um nível abaixo de outras como Quorthon (Bathory, que foi o precursor dessa temática no Black Metal ) que era de sangue puro da cultura que vivia mas não caia nessa ilusão de superioridade. Essa é um tipo de arte realmente luciferiana e libertadora no principal sentido da questão pois está livre de barreiras mentalmente criadas por humanos e alcança o esplendor da liberdade em relação a natureza e sua filosofia ou espiritualidade, como cada qual deseja alcançar.





Detalhes de Legados do Inframundo retirado do site Behance - Arte e Layout por AbacrombieINK & Pestmeest





         Enfim chegamos novamente ao Legados do Inframundo, lançado numa parceria entre Mütillation Rec e Misanthropic Rec,o álbum é todo focado no Xibalbá, o sub-mundo maia que difere muito do inferno cristão. Arte e Layout por AbacrombieINK & Pestmeester, formação:

Hécate - vocais e teclados
Thormianak - guitarras e contrabaixo
V. Digger - bateria














        O lançamento nacional vem com um resumo sobre a temática:

“A temática deste álbum foi inspirada na cosmologia mítica dos antigos Mayas, sobre a morte e o inframundo (Xibalbá), presente no livro sagrado do Popol Vuh e nas profecias de Chilam Balam de Chumayel.”



         Só que o album também foi lançado internacionalmente em formato digipack pela Drakkar Productions e traz muito mais informações extras que também poderiam ter vindo no lançamento nacional.Essa é uma vantagem do Miasthenia, pois além de colaborarem com sua arte para o metal extremo eles também têm bastante bagagem e conhecimento para contribuírem com a história e mitologia pré-colombiana. Esse lançamento fará uma enorme contribuição para um maior reconhecimento da banda no exterior que já passou da hora.

Segue abaixo as informações contidas no lançamento da Drakkar Productions:


"Nesta cosmologia o universo é formado por 3 grandes estratos: céu, terra e inframundo. O céu era concebido como uma pirâmide de 13 níveis; a terra, como uma prancha quadrangular, e o inframundo como uma pirâmide invertida de nove níveis. A vida e a morte, a criação e a destruição, coexistiam e se complementavam em uma necessária oposição dinâmica. Estes ciclos se desenvolviam neste espaço cósmico estratificado, mantido pelos galhos, troncos e raízes de uma ceiva gigantesca, a árvore sagrada (Yaxcha) cujos galhos se elevam aos céus e as raízes penetram no inframundo.
O tronco desta árvore representa o mundo onde habitam os seres humanos. O Yaxcha, localizado no centro do universo, conectava os diferentes níveis cósmicos, era o lugar do ato primordial da criação.

O inframundo também chamado de Xibalbá, Mitnal ou Submundo era uma região cósmica obscura, um lugar físico subterrâneo cujo acesso se dava por meio de rios, fontes de água, cenotes, covas rochosas e cavernas. Este lugar era habitado e comandado pelos deuses da morte. Era o lugar para onde caminhavam as almas dos mortos em busca de renascimento. Os Mayas acreditavam na vida após a morte, como parte fundamental de um ciclo perene de criação, destruição e renovação. A alma dos mortos devia percorrer o Xibalbá para depois se juntar com os ancestrais, assegurando assim a renovação do universo. 

O inframundo era assim concebido como o reino da morte, das trevas e escuridão (Akbal), apesar do Sol atravessá-lo todos os dias durante a noite. Este reino da desolação e do sofrimento era também fonte de vida e de renascimento eterno. Pelos tenebrosos caminhos do Xibalbá, seres malignos estão à espreita, empenhados em atormentar e destruir os humanos, mas ali residem também as forças geradoras que fazem brotar os vegetais e que dão solo firme às árvores da selva. 

O Xibalbá não representa o sofrimento eterno, como acontece no inferno cristão, mas sim uma etapa na existência humana que teria de ser superada, para se alcançar um nível mais elevado. Essa viagem ao Xibalbá nos ensina que devemos ter força e coragem para submergir em profundidade, em algum momento da vida, no lado mais obscuro, destrutivo, depressivo, angustioso e doloroso da existência humana, para viver em vida a experiência da morte, porque só no “inframundo da alma”, entenderemos o que somos. Esta experiência te convertera em um renascido, em um iniciado nos mistérios do Xibalbá.”










         Com essas informações a viagem fica muito mais profunda e o horizonte da música fica bem mais ampliado. Focaremos então na musicalidade do trabalho.

         O Miasthenia foi uma banda inovadora, uma das primeiras a cantar no português e em seu primeiro álbum (XVI) assumiram de vez a temática do paganismo das antigas américas. E isso não foi simplesmente escrever sobre os ameríndios e fazer uma sonoridade na mesma linha do paganismo europeu que já existia com muita força e influência no metal mundial. Eles foram moldando sua identidade como vimos no resumo de sua discografia e criaram nos anos 2000 uma sonoridade que realmente remete as eras antigas dos maias, incas, astecas e todos os outros povos e tribos espalhados pela América. Isso muito devido a Thormianak  ter assumido as guitarras e Hécate ter ficado só por conta do vocal e teclado conseguindo uma grande evolução com o instrumento.

         Outra parte importante é a temática toda focada na morte e no submundo. Apesar dela ser um tema recorrente nos trabalhos do Miasthenia como Batalha Ritual que é focado nos rituais antropofágicos dos índios tupinambás, Supremacia Ancestral com atos de resistências bem agressivos culminando em assassinatos e destruição dos inimigos. Em Legados do Inframundo a morte é abordada em todos os seus aspectos como físico, mental e espiritual. Seria a parte satânica da cultura maia, visto que o satanismo está muito além do diabo e inferno cristão que usam como ferramenta de manipulação, sendo ele focado na morte e no caos primordial. O Xibalbá também representa um forte sentido psicológico de força e superação, pois pode se fazer um paralelo de sua jornada com um momento nosso de queda e ascensão do fundo do posso para uma nova vida com mais experiência e sabedoria.





Inspiração para o album Legados do Inframundo





         O álbum inicia com Deuses Fúnebres, uma introdução onde o teclado gera um clima bem sinistro e os tambores ao fundo complementam o clima enquanto são narradas palavras ora em vocal rasgado tradicional, ora em vozes mais limpas:

“ A saga ao Xibalbá, ao estado primordial. Império do medo, dos deuses da morte, de seres disformes, de fetos e larvas. Santuário sagrado. Forças do Popol Vuh. Submundo nos ciclos do tempo. Inframundo da alma ... “


        
         Em sequência entra o peso de Saga ao Xibalbá, com rifes mais ríspidos e estridentes.  Estamos falando de uma banda que tem todo nível pra se tornar mainstream e  que permanece firme no underground até hoje, coloca muita banda gringa dito grande no bolso. Uma boa marca são algumas partes dos vocais flertando com o gutural. A letra recita uma parte das profecias de Chilam Balam de Chumayel:

“A lua e o vento
 A noite e o dia
 Tudo caminha, tudo passa
 Todo sangue chega ao lugar de seu repouso
 Assim como todo poder chega ao seu trono”



         Entronizados na Morte é uma canção espetacular, uma das melhores de toda carreira da banda. Rifes sinistros e uma bateria quebrada dão início a faixa que logo evolui pra uma metranca onde aqueles rifes bem agudos e profundos (como os tradicionais do Satanic Warmaster por exemplo, só pra citar uma referência.) entram em cena enquanto é cantado:

“Com honra e fúria me ergo na descida ao Xibalbá. Tudo passa em ciclos infernais: a vida e a morte, a profunda dor da morte de um punhal cravado no peito. Tudo passa.”

         Outra questão muito interessante foi o vídeo que fizeram para a música dentro de uma caverna. Ao site Questões e Argumentos Hécate fala detalhadamente sobre o processo de filmagem:


“O processo de filmagem foi trabalhoso e perigoso porque foi realizado dentro de uma caverna. Tudo foi bem planejado com antecedência, e contamos com o apoio de um guia local e seus equipamentos de iluminação e exploração de caverna. Gravamos num local distante de qualquer estrutura, dentro do Parque e Estadual de Terra Ronca (Goiás), um lugar ainda selvagem e pouquíssimo explorado. Para chegar ao local percorremos mais de 40 quilômetros de estrada de terra e depois tivemos que carregar os equipamentos à pé, no meio da mata, para dentro da caverna Angélica. Escolhemos um dia e horário que não haveria presença de turistas e deu tudo certo, o resultado foi recompensador e a experiência de exploração da caverna incrível, realmente adentramos o Xibalbá.”

        








         Voltamos então para a musicalidade de Legados do Inframundo. Sacerdote-Jaguar é uma canção mais candeciada e lembra muito os andamentos de XVI e Batalha Ritual. Ela só se torna brutal em algumas partes alternadas no final da música. É do nível de “Onde Sangram Pagãs Memórias” por exemplo. É uma das maiores do álbum com mais de 6 minutos de duração. Bela passagem da letra é:

         “Evocando mortos em transe, guiando seus passos para além do inframundo, de volta ao Mitnal, ao ventre da Deusa, de fetos e larvas, de mortos esperando renascer no inframundo.



         Tok’yah da uma leve intimada na bateria e começa numa boa cadencia. Vocais em coro gritam no refrão o nome da música. Rifes cortantes junto a uma bateria cadenciada marcam a faixa. Tem até uma bela passagem com vocal limpo:

“ Mas as sementes da antiga sabedoria brotam do inframundo, das profundezas da angústia humana, do inframundo da alma.



         13 Ahau Katún é uma das música mais pesada do álbum, já começa numa metranca bem porrada, boa parte da primeira metade da faixa é marcada pela brutalidade. Depois a música evolui para passagens cadenciadas muito marcantes, algumas rápidas passagens de vocal limpo, um belo solo de guitarra. 
Uma das melhores da banda que também ganhou um vídeo feito no interior de uma queimada no cerrado brasiliense com imagens gravadas pelos próprios integrantes da banda em uma viagem ao México nas ruínas Maias.

Segue uma explicação mais profunda sobre a temática da música:

"Para os Mayas pré-hispânicos o tempo era concebido de forma cíclica, cada era representava um Katún. Não possuíam um conceito de tempo retilíneo com um destino prometido à catástrofe final. O grande sacerdote Chilam Balam em seus textos sagrados e proféticos previa os acontecimentos para cada uma dessas eras.

 O 13 Katún correspondia ao tempo em que os cristãos chegaram à América, impondo a cruz e a espada, impondo novos dogmas e convicções sobre o céu e o inferno, era o fim de uma era antiga que trouxe a destruição dos antigos ritos e escravidão.

Os invasores cristão perseguiram os sacerdotes (chilam), condenando-os como bruxos e adoradores de satã. Os textos sagrados anunciam a agonia e a morte do chilam-balam (sacerdote-jaguar), a falta de alimentos, o fechamento dos templos, os sacrifícios de sangue e, especialmente, o abandono dos mortos, com o fim dos ritos que os despertam e guiam pelo caminho do renascimento. 

O fim dos antigos ritos funerários se fez sentir no Xibalbá (reino da morte), era o fim dos ciclos de morte-renascimento-vida que ameaçavam o fim de um mundo antigo."

Por Hécate (vocalista e tecladista do Miasthenia, para "13 ahau katún" - Legados do Inframundo)

"Logo o céu cairá, cairá sobre a terra, onde os quatro deuses, os Bacabs habitam, os qie protegem da destruição" (Profecias de Chilam Balam de Chumayel)



         Em seguida temos Senhores do Mitnal, uma cavalgada intimidadora e logo a brutalidade entra em cena. A música mais bruta e turbulenta do trabalho. Em meio a carnificina esmagadora da bateria citam os senhores do Mitnal e seus papéis no cliclo de tempo e morte:

“Mitnal
 Kisin, enfermidade e caos. Ah Puch decapitando o Deus Sol.
 Hun Camé, Vucub Camé, juízes supremos da morte.
 Xiquiripat,  Cuchumaquic, reúnem o sangue. 
 Chamiabac, Chamiaholom, enfraquecem seus corpos.
 Ahalmez, Ahatocob, a morte em seu caminho.”



         Legados do Inframundo, a faixa título do álbum encerra o ciclo temático do trabalho que da início em um andamento mais "tranquilo" com um estilo bem influenciado pelo heavy metal tradicional. Uma pausa com silêncio total e o teclado emerge e logo os instrumentos de cordas se unem naquela levada bem heavy metal as vezes ganhando umas metrancas para dar um destaque:

"Vejo glifos cravados nas rochas, cenas de embate sangrento, deuses decapitados, corpos sacrificados. A serpente emplumada rastejando na escuridão. Honras a Kulkulkán!"

       Kulkulkán é a visão maia do deus asteca Quetzalcóatl que muitos ocultistas identificam com a figura de Lúcifer. A música é uma das melhores da banda e possue algumas passagens de vocais limpos:

"Do início ao fim, ao cosmos primordial."



        Mas não para por aí, se não bastasse estas oito músicas de grande qualidade a banda nos salda com uma nova versão da clássica Onde Sangram Pagãs Memórias fechando o trabalho com chave de ouro!

" Em comemoração aos seus 20 anos de existência, o Miasthenia lança esta faixa bônus que representa um momento importante na carreira da banda. Esta música faz parte do album XVI, gravado no Blue Records em 2000. Remixada, remasterizada e com vocais regravados no BroadBand Studio em 2013..."

       A parte mais marcante da música pra mim é:

"Somos a tragédia em suas veias
 Correndo para nossa fortaleza na intensa floresta
 Derramando poemas em lágrimas
 Memórias ancestrais..."



Por Deserto de Azazel













Legados do Inframundo encontra-se disponível nos sites das gravadoras que lançaram o álbum:




www.misanthropic.com.br








www.mutilationrec.loja2.com.br
13 Ahau Katún, gravado no cerrado brasiliense:





Entronizados na Morte, gravado no interior de uma caverna:

 




Senhores do Mitnal - Ao vivo no Rio de Janeiro





Onde Sangram Pagãs Memórias:


segunda-feira, 11 de abril de 2016

Miasthenia - Supremacia Ancestral, a história não contada...












            Um dos pilares do Black Metal brasileiro e principal fonte pagã na música extrema nacional. O Miasthenia chegou a um patamar bastante elevado tanto na parte musical quanto na parte lírica com extremo profissionalismo aliado ao espírito underground que continua queimando depois de mais de 20 anos de existência. Atingir um nível alto de profissionalismo costuma ser um problema se tratando de música extrema pois existem inúmeros exemplos de bandas que evoluíram bastante na parte instrumental e com isso foram perdendo um pouco ou quase toda essência de suas músicas. Com eles foi o contrário, pois conseguiram usar a técnica para expressar mais forte ainda o sentimento dedicado pela banda a arte extrema e ao paganismo das Américas.

            Sonoramente o Miasthenia vem se tornando extremamente técnico e mais brutal a cada album e este pra mim é o ápice, melhor album da banda...sem desmerecer os outros clássicos mas é só escutar ele pra ter noção.  Em Supremacia Ancestral a banda fez uma enorme colaboração não somente para o underground como também para a História de nosso continente. Pois o encarte do cd vem com 2 páginas dedicadas a história verídica de cada música, todas sobre resistências dos ameríndios a colonização e cristianização das antigas culturas. É um trabalho que se fosse lançado com um livreto A5 ficaria demais, tendo espaço para ilustração de cada música junto a sua história.

            Assunto esse que o sistema esconde de nós desde o início em aulas e livros escolares, ressaltando sempre uma visão de glória européia e cristã da situação toda. Como se houvesse uma descoberta de um novo mundo e que os nativos desse mundo foram salvos por uma cultura  superior. Eles retardam nosso aprendizado numa tentativa de modificar a história real e acabam conseguindo na maioria das pessoas conformadas e de pouco questionamento.

            É o tal da “história é contada pelos vencedores”, mas esse tipo de vencedor que distorce tudo a seu favor é um mero vencedor bélico e um verdadeiro perdedor em questão de moral e espiritualidade. Pra mim os únicos vencedores nessa situação toda foram aqueles que lutaram por suas crenças, família e seu território mesmo que isso tenha custado a própria vida. Então escondendo o lado honrado do povo verdadeiramente guerreiro é uma “bela” de uma ferramenta de manipulação, pois se tira a honra de um povo que perdeu uma guerra não sobra nada e isso é o suficiente para manipular a massa que em sua maioria não faz o mínimo de esforço para questionar o que lhe é enfiado pela guela abaixo.






Arte feita por Latuff, retirada do site Geo-Metal





            E essas informações contidas no encarte foram buscadas em documentos da época que são pouquíssimo divulgado.  As letras são elaboradas pela vocalista, tecladista Hécate, que também é fundadora da banda, é uma profissional na área de história.

            Em uma entrevista ao site Criado Mundo ela fala mais detalhadamente sobre sua relação profissional com a banda:



Anderson:  Hécate, por favor, você poderia falar do seu trabalho acadêmico e de como ele se relaciona com a temática tratada pela banda?

Hécate – Sim, eu fiz mestrado (2000) e doutorado (2006) em História da América, analisei crônicas espanholas escritas nos séculos XVI e XVII sobre os Incas do antigo Peru. A análise e “desconstrução” de discursos colonialistas e demonológicos sobre as diferenças confrontadas na América é parte de minhas preocupações ideológicas pós-coloniais e que de fato estão ligadas à proposta temática do Miasthenia. Mergulhei nestes estudos em busca de uma “história do possível” que revelasse outras formas de entendimento do sagrado, da história, da natureza, do corpo, das identidades e relações entre os sexos, diferentes do ponto vista cristão colonialista que tendeu a ocultar e desclassificar tudo o que parecia ameaçar o poder e a ordem política e social dos colonizadores. Já que estavam interessados em apagar toda e qualquer crença ou visão de mundo pagã que colocassem em questionamento os preceitos e moralidade cristã.












Deuses da Aurora Ancestral:


Nos séculos XVI e XVII a América conheceu, em toda parte, casos de profetas xamãs que anunciavam a derrota do deus cristão e o retorno dos antigos deuses, o que resultou em algumas manifestações de ódio e revolta contra a ação missionária cristã. Os seguidores das antigas religiões e filosofias pré-colombianas foram perseguidos e condenados pelos inquisitores e extirpadores das idolatrias. No entanto, a História Oficial ocultou durante muitos séculos essa resistência ameríndia à cristianização, enaltecendo os missionários e conquistadores que desembarcaram na América. Este álbum narra Outras Histórias, baseada em documentos coloniais, onde o esplendor das civilizações e tribos pré-colombianas permanece vivo na memória, exaltando a honra e o espírito bravio dos guerreiros que resistiram à cristianização.



Exortações de Ocelotl:

Em 1530 no México, o bispo Zumárraga os perseguiu com poderes inquisitoriais. Martin Ocelotl (jaguar) protagonizou uma das mais celebras causas desses primeiros tempos, e foi acusado de idolatria de feitiçaria junto ao Santo Ofício. Ocelotl dizia ter sido o único sobrevivente da matança ordenada por Montezuma que, desgostoso com os presságios sobre a vinda de Cortez, resolvera punir todos os adivinhos astecas, Ocelotl renegou o cristianismo e iniciou uma pregação contra os padres. Por onde passava dizia que a humanidade estava sendo destruída pela chegada dos “apóstolos de cristo” (=franciscanos). Se “apóstolos monstruoso haviam derrotado o “sol asteca”, ele, Ocelotl, venceria o “sol franciscano” anunciava o profeta, insistindo para que os astecas renegassem o catolicismo. As exortações de Ocelotl se concretizaram em uma seita anti-cristã que celebrava os ritos em pro de Camaxtli e fazia sacrifícios ao deus Tlaloc.



Taqui Ongo:

O movimento conhecido como Taqui Ongo surgiu no Peru central durante os anos de 1560. Era uma seita organizada e hostil à presença dos colonizadores cristãos. Taqui significa “canto” ou “dança”, na língua quéchua, enquanto ongo se refere a “enfermidade”. Para os cristãos era sobretudo uma heresia, na qual os povos andinos renegavam o cristianismo e retornavam aos deuses antigos; para os adeptos, tratava-se antes de tudo de uma cerimônia, a “dança da enfermidade” ou “enfermidade da dança”, a ritualização da tragédia dos antigos deuses que estavam a vagar abandonados pela falta de sacrifícios e oferendas rituais de outrora. Sacerdotes percorriam as aldeias, a modo de xamãs, e anunciavam a chegada de uma nova era, tempo em que os conquistadores e seu deus seriam expulsos da Terra, entronizando-se em seu lugar as huacas, divindades ancestrais. Possuídos pelas huacas e xamãs prediziam sua vitória em meio aos cantos e danças da multidão.



Tawantinsuyo:

Em 1537 surge o império neo-inca, na inacessível região de Victos. Refúgio de parte da dinastia incaica que não se curvava à dominação colonial, este reino foi o bastião maior da resistência ao colonialismo e cristianização do Peru. Ali se restauraram o culto solar e a divinização do imperador inca, da lua, múmias imperiais e das huacas. Os incas de Vilcabamba pregavam abertamente contra a religião cristã e a opressão colonial. O inca chegou a massacrar certas aldeias e a destruir huacas de povos que haviam aderido ao cristianismo. Até o ano de 1572 o império neo-inca moveu guerras contra os colonizadores.












Tzompantli (instrumental):

Os antigos mesoamericanos tinham o costume de decapitar as vítimas dos sacrifícios humanos e conservar os seus crânios empalados no Tzomplantli, um altar de pedras e troncos de madeira para a exibição pública das cabeças dos prisioneiros de guerra. Em honra aos deuses o Tzomplantli representava uma manifestação do poder bélico e do espírito guerreiro em tempo pré-colombianos.



Guerra de Mixton:

Entre 1541 e 1542, na Nova Galícia (norte, costa do pacífico) especialmente no vale do Tlautenaugo, os xamãs anunciavam a vinda de Tlaloc e de todos os ancestrais ressucitados, pregando o expurgo dos costumes cristãos, dos sacramentos e uma luta contra os cristãos. Os que perseverassem no catolicismo seriam privados da luz do dia e devorados por bestas ferozes. Oss que retornassem às tradições dos antepassados e fossem à guerra recebiam a ajuda de Tlaloc. Incendiaram igrejas, destruíram cruzes, mataram missionários e chegaram a obter vitória na luta defensiva contra a repressão colonial cristã.



Idolatrias:

No século XVII, na região das missões jesuítas do Ria da Prata, os xamãns guaranis, empenhados em valorizar as divindades ancestrais, encarnavam os homens-deuses da mitologia guarani. Percorrendo as aldeias, falavam como o antepassado mítico, Nhanderuvuçu, o senhor da morte, prometeu salvar os guaranis das garras dos missionários. Alguns organizaram seitas, a exemplo, do santos óleos. Em 1645 Nheçu chegou a ter sua própria igreja apostata onde sacrificou exemplarmente dois jesuítas capturados nas missões.



Kayanerehn Kowa:

No início do século XVI surge a Kayanerenh Kowa, a grande aliança das cinco sombrias tribos guerreiras iroqueses. Entre eles se destacavam os Mohawks. Em 1625 um grupo de jesuítas tentava evangelizar essas tribos norte-americanas, mas os iroqueses resistiram ao evangelho durante séculos. Em um episódio os iroqueses invadem com violência a aldeia onde estava o padre Jean de Brébeuf e o submetem a uma longa e agonizante série de torturas. Vendo que entre os tormentos o padre não cessava de exortá-los e clamar pelo seu mísero deus, os iroqueses lhe abriram o peito e arrancaram-lhe o coração palpitante, finalmente beberam-lhe o sangue. Os padres Jogue e Juan de Lalande tiveram suas cabeças cortadas e empaladas ao redor da aldeia Mohawk e seus corpos foram jogados no rio. Denominado pelos Mohawks como o “Hábito Negro”, o intruso veio pregar a luz, se vê envolvido nas trevas. No meio desses tormentos, o herói mohawk cantava de maneira bárbara e heróica, a glória de suas antigas vitórias, cantava o prazer que sentiu outrora imolar seus inimigos.




Formação Supremacia Ancestral: 

Hécate: vocal e teclado
Thormianak: guitarra
Mist: baixo
Hamon: bateria

























Imagem do encarte do album XVI (2000). Foto editada e tirada por Susane Hécate em Sacsayhuamán (Cuzco) no Peru em 1997. Uma "fortaleza cerimonial" dos Incas, constuída entre os século XV e XVI, na época de seu apogeu.






Vídeo do lançamento de Supremacia Ancestral:






Exortações de Ocelotl:





Taqui Ongo:







Download Miasthenia - Supremacia Ancestral ( com autorização da banda, já que o álbum  está esgotado):

http://www.4shared.com/rar/CL1o4QAR/miasthenia_-_supremacia_ancest.html



Busque sempre obter o material original, o novo álbum Legados do Inframundo ainda está disponível nas gravadoras que lançaram o álbum:

www.misanthropic.com.br

www.mutilationrec.loja2.com.br







Deserto de Azazel